Há pessoas que nos tiram do sério, que nos fazem arder por dentro. Por uma palavra que seja, um gesto que fere ou um silêncio que congela. Há relações em que esperamos pela mudança e pela reparação, e esperamos, esperamos, mas aquele gesto de reconhecimento de que tanto aguardávamos não tem forma de chegar. E sentimos raiva, frustração, dor. Tudo isto é natural. Mas há um momento – difícil, mas necessário – em que é preciso reconhecer: não podemos mudar o outro.
Isto, por si só, já é doloroso. Porque implica fazermos o luto das nossas expetativas, daquilo que gostaríamos que o outro fosse. Aceitar que a mãe não vai compreender melhor, que o pai não vai ser mais presente, que aquele amigo não vai deixar de ser ausente e que o companheiro talvez nunca vá saber escutar como precisamos.
Mas então e agora? Se não podemos mudar o outro… será que podemos mudar o quanto ele nos atinge?
E aqui começa outro caminho. Um caminho que é mais demorado, mas também é mais nosso. Porque o que nos fere de forma tão profunda, muita vezes, não é só o que o outro faz. É o que isso nos reativa por dentro. É aquela velha ferida de não sermos ouvidos. É aquela impressão antiga de invisibilidade, de termos passado despercebidos quando mais precisávamos de ser vistos. É o eco de uma infância em que aprendemos que, para sermos amados, era preciso sermos perfeitos.
A boa notícia é que, isso sim, pode mudar. Podemos começar a escutar melhor, de forma mais consciente, o que é nosso e o que é do outro. A distinguir o passado do presente. A não reagir como se cada desilusão fosse uma repetição exata da primeira dor. E, sobretudo, podemos começar a sair da posição de quem espera. De quem está sempre à espera que o outro mude.
Não é sobre “não ligar para nada”, nem se trata de criar uma armadura e fingir que nada nos atinge. É sobre passar a escolher, com mais consciência, o que nos toca e o que fazemos com isso. É um trabalho interno. Um reencontro com aquilo que é nosso, para que o outro deixe, aos poucos, de ter esse poder imenso sobre nós. Mantendo assim essas relações, mas de um modo mais realista.
DIOGO CATALINO
Psicólogo Júnior - Dialógicos
Texto integrado na Rúbrica Ver.Sentir.Reflectir - Agosto 2025